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As verdades que não queremos enxergar em nós

Todos nós escondemos coisas dos outros, mesmo os de nossa intimidade. E de nós mesmos. Sim, isso é possível: como cantava Renato Russo, “mentir para si mesmo é sempre a pior mentira”. Fazemos “vista grossa” para algumas verdades que não queremos enxergar em nós, ocupando-nos com outras atividades ou pensamentos e deixando a vida passar.

Um sinal de que temos uma visão errada sobre nós mesmos, ou que estamos escondendo algo de nós em nosso próprio interior, pode se dar quando várias pessoas nos falam, com frequência, sobre certo problema ou defeito que temos. Algo que fizemos, deixamos de fazer, quem sabe ainda possamos realizar. Cutucam-nos sobre algum tipo de perigo a respeito de nossa pessoa, algo indesejado e incômodo. Não que os outros estejam sempre certos: a voz do povo não é a voz de Deus, a multidão crucificou a Jesus Cristo e aclamou Hitler na Alemanha, Lênin e Stalin na URSS que matou cerca de 20 milhões de pessoas.

Pare para refletir no que muitos falam de você, ou no que aqueles que convivem mais com você, ou há mais tempo, dizem sobre quem você é. Nem sempre é implicância, ou a tal “inveja”. E pode até ser isso mesmo, mas, no fundo, a implicância ou inveja alheias revelarem aspectos negativos que você tenta ignorar em si mesmo. Ninguém gosta de ser criticado, mas o sábio e humilde ao menos pensa sobre o que ouve e faz ponderações. E o mais importante: se necessário, muda.

Muitas vezes, certas verdades indesejadas estão “presas” dentro de nós. Nem sempre fazemos por querer, temos mecanismos de autodefesa, nosso ego, nosso orgulho. Mas todos nós temos coisas que estão lá no fundo, como em uma caixa preta que evitamos encarar. A Psiquiatria já sabe que costumamos enxergar nos outros nossos próprios defeitos. Acusamos-lhes, muitas vezes, do que não aceitamos em nós mesmos.

Exemplo é o caso de homofóbicos que, na verdade, odeiam o que são: homossexuais. Odeiam nos outros o que não suportam em si. O filme “Beleza Americana” é uma obra-prima sobre questões como essa (não apenas homoafetividade). Há, ainda, aqueles que sempre repetem que estão rodeados de invejosos, quando eles na verdade são pessoas invejosas, veem nos outros o que são. Não que não sejam vítimas de inveja, coisa corriqueira, notadamente em uma geração narcisista como a nossa, e tendo em vista o fato de que todos nós temos inveja e cobiçamos. Estou me referindo a uma obsessão com algo que sempre enxergamos nos outros e não aceitamos em nós, no caso, a inveja. Ou a amargura. Ou o ódio.

Quais são as verdades sobre si mesmo que você não quer admitir? Tem algum ou alguns vícios, e não para quando quiser como afirma? Aquilo realmente não lhe faz mal, ou não tão mal? Aquela pessoa não lhe faz bem. Você não ama seu companheiro ou sua companheira, ele ou ela não ama você. E você odeia aquela pessoa que bajula. Você se odeia, e desfere o ódio em direção aos outros? Você desistiu de si próprio? Você não está fazendo o que no fundo sabe que deveria fazer?

Você feriu alguém, e não apenas foi ferido? Você não tem esta autoestima toda, é apenas fachada para disfarçar seu complexo de inferioridade, quem sabe humilhando outras pessoas? Tem se comportado como um chato que se acha dono da razão? Uma coisa é ter convicções, outra é ser inflexível e arrogante e prepotente.

Quais são suas “caixas-pretas”, suas verdades que precisa encarar em si mesmo? O que você vê no outro, talvez seja muito maior em você.

Avalie-se de tempos em tempos. Faça uma verdadeira faxina interna. Não fique se comparando, não é isso: reflita. Observe o que dizem, e repetidamente. Eles podem ser pessoas desprezíveis, às vezes, cheias de ódio, inveja e amargura, mas e você? E o que eles falam não tem alguma verdade?

“Conhece-te a ti mesmo” é a mais antiga das sabedorias. E essa jornada dura uma vida inteira. É íntima, e volta e meia se precisa mudar de rotas, de pensamentos, de ideias. Não é fraqueza, é adaptação e sabedoria. Por outro lado, manter nossas raízes, aquelas que sustentam a árvore que somos, de onde viemos, é uma preciosidade. Saber quais delas cortar pode ser vital.

Procuremos melhorar a cada dia. A maioria das pessoas, por mais que diga que faça isso, não o faz. A verdade é que é muito difícil reconhecer os próprios erros, e ainda mais tortuoso mudar de comportamento ou pensamento quando a vida ou o coração nos pedem isso. Mas cada dia é um dia para recomeçar. Você não tem de repetir o passado. Repetir o que fizeram com você: “Pessoas feridas ferem pessoas”. E não tem de se cobrar tanto… por mais que alguns, ou a sociedade lhe cobrem, e sempre cobraram e sempre cobrarão.

Faça o seu melhor, um dia de cada vez, errando e acertando, caindo e levantando, conhecendo-se a si mesmo e amadurecendo. Procure a joia que é o discernimento: saber o que ouvir e o que deixar para lá, o que fazer e o que não fazer, quem você é e quem não é. Parece simplório, mas não é nada simples. E que disse que viver, e tentar ser feliz seria fácil?

 

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