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A “juventude transviada” e o desprezo pela velhice no Brasil

O tema do ENEM 2025 vem sendo bastante comentado: Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira”. Uns juram que tem “pegadinha”, eu achei a descrição vaga e imprecisa — até porque envelhecer não é restrito a terceira idade, e “o envelhecimento” me pareceu carecer de um complemento. Mas isso sou eu sendo racionalista; o que chama a atenção, e acredito que da maioria, é o fato de que o ENEM foi “mexer com os velhinhos”. O pessoal da terceira idade, os idosos, quem diria? Porque é isso que vem à nossa cabeça — mais uma vez, cabe um “mundo” em “envelhecimento” no tema da redação, para além da primeira impressão. Bem, o Brasil não é um país que pensa muito em idosos, aqui a terceira idade é muitas vezes marginalizada, desprezada ou atacada. Essa é, sim, a cultura do povo brasileiro, embora sempre haja muitas exceções entre nós.

Apesar de constituir-se em uma nação de contrastes vibrantes, do “homem cordial” de Sérgio Buarque de Holanda, de um tipo de condescendência coletiva histórica, o Brasil se depara com um dilema social de antigas e espessas raízes. É que nossa “juventude transviada”, como a imortalizada em um James Dean libertário, ousado e sonhador (não no sentido da delinquência), parece cada vez mais desconectada com a geração dos mais velhos — em especial os idosos. Uma juventude culturalmente desorientada em relação ao valor da sabedoria e da experiência acumulada com os anos de vida, com as rugas na pele, com os hábitos e tradições.

Mas não é só a peculiaridade de uma sociedade brasileira que vira as costas para a terceira idade; o fenômeno é mundial, ao menos no Ocidente. Vivemos em ritmo acelerado, obcecados pela novidade, e o conhecimento instantâneo da internet (dos smartphones) parece ter destronado (se é que já de fato coroou) a memória histórica, a sabedoria e ao mesmo tempo o cuidado para com a fragilidade dos idosos.

Tal desconexão não é meramente problema familiar, mas sintomático  em uma cultura que supervaloriza a aparência, de preferência com bisturis, mil tratamentos estéticos e filtros nas redes sociais.

É mais grave quando se trata da mulher, muitas vezes: a bela namorada se torna mãe, depois esposa e mais comedida, e ainda profissional exausta; então, a sociedade não vê mais viço nela, muitos homens vão atrás de novinhas e a “enterram viva” em sua velhice progressiva — a mulher sempre foi sobejamente valorizada, na História, muito mais que por seu intelecto e sua personalidade. Ou foi tachada de “louca”, “desavergonhada”, “Lilith”, enquanto envelhece e  vive a cronologia da trindade de Hécate na mitologia grega: a Donzela (Lua Crescente), a Mãe (Lua Cheia) e a Anciã (Lua Minguante). A Donzela é aquela que a sociedade quer, e muitas das mulheres lutam para se parecerem com sua versão mais bela e admirada.

A cultura que não quer as rugas, a vulnerabilidades e os exemplos dos mais velhos

A cultura brasileira atual, mais que em tempos pretéritos e diferentemente de muitas culturas orientais, não enxerga e não trata seus idosos. No Brasil contemporâneo, a ênfase é na produtividade econômica, na formosura e vitalidade efêmeras e, enfim, na obsessão dos alquimistas: a eterna juventude.

Pessoas de gerações X e millenial, como os que nasceram ainda antes de 1950s, muitas vezes são aposentados (quando conseguiram essa proeza no Brasil, e com remuneração ridícula pelos impostos que pagaram a vida toda); ou lhes molesta a saúde, física e mental. São assim percebidos como fardos ou, no mínimo, seres pouco relevantes no motor frenético da vida pós-moderna que celebra o êxtase, o aqui e o agora, o fugaz.

Como resultado, um processo de alienação silencioso: os mais belhos, em especial os idosos, são relegados à margem da vida social, confinados ao lar ou a instituições gélidas, e sua história e experiência deixam de ser a âncora da família ou da sociedade para se tornarem um incômodo logístico, econômico, social, um parasita indevido que “passou da idade”. Mas que idade?

Sociedades orientais como Japão, Coreia do Sul e China tradicionalmente mantêm um obsequioso respeito pela velhice, muitas vezes em um princípio filosófico conhecido como Piedade Filial ou Kou (孝) (Perceba quantas marcas (da vida?) nesse símbolo!) Nesses contextos, o idoso é considerado um Patrimônio Vivo, guardião da tradição e da história familiar. O avô ou a avó são consultados; suas opiniões têm peso, e sua presença na estrutura familiar é central, não periférica. Como na Antiguidade em  geral e entre os povos indígenas. Ali, a velhice é vista como um estágio de elevada sabedoria, e não de declínio, onde a deferência dos mais jovens é um dever social e moral intrínseco.

E soluções?

Sim, os mais velhos tendem a reclamar muito, a vida raramente lhes foi suave, ainda mais no Brasil. Mas nosso país — mesmo dilacerado em politicagens e crise econômica, social e existencial — deveria se esforçar para promover uma mudança de valores em relação, especialmente, à terceira idade. Integrar os idosos ativamente na vida social — educação, trabalho voluntário ou decisões familiares, inclusão social e tecnológica, por exemplo. As escolas e as famílias precisam ensinar que o respeito aos mais velhos não é um ato de caridade (embora também seja, em um sentido sem dramatização), mas um reconhecimento da humanidade e da História.

E olhar com mais carinho e delicadeza o fato de que nosso destino é envelhecer — envelhecemos todos os dias, a Lei da Entropia nos desorganiza. Com a idade, avultam as belezas internas: sabedoria, memória, resiliência. A velhice é uma bênção — nem todos a tiveram ou terão, ter histórias para contar e ver o mundo se transformar, e ainda aquela criança lá dos idos de algum lugar ali presente.

Há ainda uma lição acerca da velhice: o Tempo deve ser venerável — é o que temos de mais precioso. E ele passa rápido. E o idoso ou “velho” de hoje amanhã já é você, já sou eu — cuide-se, cuide de quem sobreviveu, viu e sabe de muita coisa, e enfrenta a solidão do ocaso da vida.

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